domingo, 13 de junho de 2021

Carta ao bolsonarista renitente

Prezado bolsonarista,

Eu já entendi porque você votou em Jair Bolsonaro em 2018. Foi uma mistura de revolta contra o que você chamava de “roubalheira do PT”, com o cansaço da velha política representada por Michel Temer, a busca por uma alternativa econômica e, em alguns casos, o fanatismo político e religioso. Aliado a isso, a facada que o candidato recebeu a poucos dias da eleição, e que não saiu das TVs, multiplicou por mil sua exposição até o ponto de você achar que só havia ele para votar. Está claro e até dá para entender o inaceitável. Mas, agora que tudo isso desabou, o que me ocupa nestes dias é tentar compreender por que você ainda cogita votar neste homem em 2022.

Se estou correto, os anseios que o fizeram eleger Bolsonaro foram destruídos. A corrupção que você odiava ganhou força. A começar pelo desmantelamento da Lava-Jato com o apoio explícito do seu presidente. Houve também a demissão de Sergio Moro do Ministério da Justiça porque ele se negou a demitir o diretor da Polícia Federal e nomear um delegado amigo do chefe. Você sabe, Bolsonaro queria ter um canal direto na PF para impedir que investigações contra seus filhos e seus amigos prosperassem. É tão simples quanto escandaloso. Você viu.

Você deve lembrar ainda que Bolsonaro, sua mulher e seus filhos abasteceram suas contas privadas com dinheiro público desviado dos salários dos servidores de gabinetes da família, com as famosas rachadinhas. Uma delas, a do zerinho senador, está sob investigação do Ministério Público no Rio. O mesmo zerinho que com salário de R$ 33,7 mil brutos comprou uma mansão de R$ 6 milhões em Brasília. Se a casa fosse financiada pelo Banco do Brasil, ele teria de dar uma entrada de R$ 1,2 milhão. O restante seria pago em 189 meses, com a primeira parcela de R$ 67,7 mil, o dobro do que ele recebe no Senado.


Na velha política, o colo oferecido pelo Centrão ao presidente, em troca de verbas bilionárias do orçamento que era para ser secreto e virou o mal-afamado “tratoraço”, não deixa margem para qualquer dúvida. O governo Bolsonaro virou abrigo para a turma que sempre se agarrou ao poder e que esteve presente nos governos de Sarney, Collor, FHC, Lula, Dilma e Temer. Apesar do seu voto de protesto, a velha política do toma lá dá cá está de volta, como uma estaca fincada no coração do seu querido presidente. E agora sem a Lava-Jato.

A alternativa econômica virou fiasco. O grande feito deste governo, a reforma da Previdência, quem resolveu foi o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia. Ainda assim, o tamanho da reforma que era para ser de R$ 1,2 trilhão caiu para R$ 800 bi por intervenção do seu presidente. De resto, Bolsonaro boicotou todos os projetos do seu Posto Ipiranga. Há um apagão no horizonte, o teto de gastos está ameaçado, a inflação se aproxima dos 10% anuais e você, caro bolsonarista renitente, vê seu dinheiro sumir cada vez mais cedo da sua carteira.

Na religião, Bolsonaro é uma fraude. Você conhece algum cristão verdadeiro que seja tão desalmado quanto ele? Faça uma seleção das suas piores frases sobre as mortes causadas pela Covid e você me dirá. Ou lembre-se do que ele falou sobre tortura e assassinato por razões políticas e reflita. Na questão do fanatismo político pode-se até encontrar semelhanças entre os métodos do seu presidente e a intolerância de alguns de vocês. Mas mesmo estes sairão perdendo, a não ser que sejam militares e estejam agarrados numa teta do governo.

Os que pregam uma intervenção militar são minoria entre vocês bolsonaristas. E são toscos intelectualmente. Imaginam que o Brasil vai melhorar se o capitão puder governar sem freios e impedimentos legais ou institucionais. Estão enganados, você sabe. O país vai piorar, muito mais do que já piorou sob a guarda do capitão. Se você não for amigo da família, vai ficar na estrada, prezado bolsonarista iludido. Espere enrolado na bandeira por tempos melhores, você vai ser tratado como se estivesse na fila do INSS esperando um benefício. Vai mofar.

Diante disso tudo, por que você ainda está disposto a votar nele outra vez?

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