domingo, 22 de março de 2020

Porque ontem foi sábado, e Bolsonaro é assim todo dia

À falta das obrigações que o cargo lhe impõe em dias úteis, confinado no Palácio da Alvorada onde comemorou 65 anos de idade na companhia da mulher e dos filhos, o presidente Jair Bolsonaro dedicou-se, ontem, a fazer o que melhor sabe: fustigar adversários, cutucar aliados e dissertar sobre o que não entende.

Logo na semana em que os profissionais da saúde começaram uma campanha onde pedem: “Nós estamos aqui por vocês, por favor fiquem em casa por nós”; Bolsonaro disse não ver razão para que se impeça a livre circulação de pessoas sadias que possam trabalhar. Reclamou do fechamento de shoppings e de templos.

A Constituição garante a realização de cultos, citou. “Tem gente que quer fechar as igrejas, o último refúgio das pessoas”, irritou-se. “Lógico que o pastor vai saber conduzir seu trabalho, vai ter consciência, vai decidir lá”. O Conselho Mundial das Igrejas sugeriu o fechamento dos templos neste fim de semana.

“A chuva tá vindo aí, você vai se molhar. Agora,
se você botar uma capinha aqui, tudo bem. Passa.”
De bermuda, camiseta da Seleção e chinelos, dirigido por seus três filhos mais velhos (Flávio, Carlos e Eduardo) que se encarregaram da tarefa, Bolsonaro gravou um vídeo postado nas redes sociais para anunciar que o Exército fabricará o Reuquinol, remédio que “poderá evitar um contágio mais rápido do coronavírus”.

Perdeu mais uma oportunidade de ficar calado. Obrigou o número dois do Ministério da Saúde a repetir na televisão que não existe ainda nenhum fundamento científico de que o Reuquinol impeça o contágio da doença. O remédio desapareceu de muitas farmácias brasileiras desde que Donald Trump falou a seu respeito.

Apenas pessoas com receita para tratamento de enfermidades como malária, lúpus e artrite reumatoide podem comprar o Reuquinol. “Ninguém vai poder guardar esse remédio pensando no coronavírus”, apressou-se a explicar João Gabbardo dos Reis, secretário-executivo do Ministério da Saúde.

Bolsonaro fechou o dia atacando os governadores de São Paulo e do Rio em entrevista à CNN Brasil. Para ele, os governadores que decretaram quarentena extrapolam dando “dose excessiva do remédio e que o remédio em excesso se torna um veneno.” Bem, essa é a sua opinião, mas não a dos especialistas no assunto.

Empenhado em politizar a discussão sobre o coronavírus, aproveitou para chamar de “lunático” o governador João Dória (PSDB-SP). Queixou-se de que Dória usou o nome dele para se eleger “e está se aproveitando para crescer politicamente”. Sobrou, naturalmente, para Wilson Witezel (PSC), governador do Rio.

Bolsonaro não se arrependeu de ter chamado o coronavírus de “gripezinha. Garantiu que sobre 60% dos brasileiros a COVID-19 “não terá efeito algum”. Negou que exista uma crise entre ele e o ministro Luiz Henrique Mandetta, da Saúde. E assim contou o que de fato estaria se passando: "Não existe atrito, mas uma conversa entre nós. Mandetta sabe que uma população em depressão perde imunidade e fica mais propensa a doenças".

Quanto ao impacto da doença na economia, foi vago. Recusou-se a comentar sobre o mini pibinho previsto para este ano de 0,02%, embora “alguns economistas falem de crescimento negativo”. E arrematou: “Minha preocupação é com a vida das pessoas e com o desemprego criado por esses governadores irresponsáveis”.

Aviso de utilidade pública: Na próxima eleição presidencial, antes de digitar na urna o número do seu candidato, passe álcool gel nas mãos. E vote melhor.

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