domingo, 29 de março de 2020

Pecado mortal

Somente uma pessoa que deliberadamente trabalha contra o interesse da maioria agiria como o presidente Jair Bolsonaro agiu em diversos momentos dessa crise sanitária. Já disse outro dia que ele é um homem mesquinho e egoísta. Mas é pouco. Bolsonaro não gosta do ser humano, se lixa para o próximo e só se preocupa com sua família e sua corriola. Mexeu com a família ou com os parças, mexeu com ele. Fora isso, danem-se. Somente um homem assim baixaria um decreto autorizando a realização de cultos religiosos em meio a uma pandemia de coronavírus.


O que isso significa? Significa que Bolsonaro deu oficialmente argumento para que pastores e bispos de diversas igrejas evangélicas exijam a presença dos seus fiéis e das carteiras dos seus fiéis nos cultos. Os pobres e explorados filhos de Deus que podiam ficar em casa, orando solitariamente, sem pagar dízimos aos devoradores de poupanças, agora não têm mais essa desculpa. O presidente do Brasil baixou decreto estabelecendo que culto religioso é uma atividade essencial e como tal pode ser realizado mesmo em meio ao caos sanitário que o planeta vive. Nenhum problema se a aglomeração facilita o contágio. Deus protege, acredita o devoto capitão.

Os bispos da Universal e das suas igrejas-satélites já estavam tendo pane de criatividade para seguir sugando o suado dinheirinho dos fiéis que, por orientação do Ministério da Saúde, permaneciam em casa. Um deles, o televangelista R.R. Soares, cunhado de Edir Macedo, passa os dias na TV pedindo que os seus crentes depositem dinheiro na conta da sua igreja. Como Ancelmo Gois mostrou aqui na quarta-feira, R.R. mandou os fiéis que não entendem de internet ou não têm conta bancária pedir auxílio a parentes ou amigos para fazer a remessa. Mais do que uma exploração vergonhosa, trata-se de um pecado. Mortal.

Essa exploração de gente fiel, simples e ingênua, que nunca foi combatida pelos governantes brasileiros, mereceu agora espaço num decreto presidencial que além de ignorá-la ainda a estimula. Por que, em nome de Deus, o capitão faria uma sandice dessa? Como só age com a cabeça eleitoral, por puro medo de que as suas bobagens o tornem no primeiro presidente a não conseguir se reeleger no Brasil, é óbvio que ele quer agradar os chefes evangélicos para obter suas simpatias e merecer seus apoios em campanhas eleitorais.

Será que Bolsonaro ignora que estes mesmos pobres fiéis que estão sendo explorados pelas igrejas mesmo em meio a esta pandemia são, afinal, os eleitores de quem ele quer ganhar o voto? Claro que não. Ele aposta na ignorância dessa turma e na ascendência que os pastores têm sobre ela. O pior é que ele tem razão. Os cultos de algumas igrejas hipnotizam muitos fiéis de tal forma que eles ficam sem ação ou não conseguem encontrar alternativas. O infundado medo da mão pesada de Deus limpa suas carteiras e os torna em rebanhos de eleitores cegos.

Foi sobre esse caldo que Bolsonaro mergulhou ainda mais fundo sua colher ao decretar a essencialidade de cultos religiosos. Saúde a gente vê depois.

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