será que um dia ainda vou agradecer ao presidente Jair Bolsonaro? É difícil imaginar isso, mas tenho que reconhecer que ele conseguiu o que poucos presidentes brasileiros conseguiram: colocar o Brasil no centro da atenção internacional.
Depois das queimadas na Amazônia e do debate sobre supostas atitudes colonizadoras de países europeus, todo mundo discute como salvar as florestas. Não somente na Amazônia. Ficou evidente que no mundo inteiro, seja na Europa, na África ou na Ásia, as áreas degradadas precisam de proteção e reflorestamento.
As ONGs também agradecem. "Nunca antes nesse país fomos tão valorizados por um presidente como o atual, que nos colocou em evidência, abriu espaço nas mídias pra mostrar nosso trabalho!", ironizou Caetano Scannavino, da ONG Projeto Saúde e Alegria, da Amazônia, num post recente. "Obrigado por algo que sempre tentamos mas nunca conseguimos como agora: nacionalizar a Amazônia e amazonizar o mundo!", escreveu.
Já faz dez anos que o Brasil se destacou mundialmente. Ainda se lembram da capa da revista Economist de novembro de 2009? A imagem do Cristo Redentor como foguete ficou mundialmente famosa.
Era euforia pura. Naquela época, o Brasil se preparava para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos e impressionava com um crescimento econômico e uma política social que tirou milhões de brasileiros da miséria.
Parecia que o Brasil finalmente ganhava a atenção e o destaque que merecia como quinto maior país do mundo. Somente na imprensa alemã, entre 1º de junho e 1º de agosto de 2014, foram publicados mais de 4 mil textos sobre o Brasil.
Em comparação com períodos anteriores, o Brasil de 2014 era um foguete midiático. Nos primeiros dois meses do governo Luiz Inácio Lula da Silva, de 1º de janeiro a 1º de março de 2003, por exemplo, o número de matérias publicadas sobre o Brasil na imprensa alemã foi de somente 737.
Mas a euforia durou pouco. A própria Economist derrubou o foguete brasileiro. Em setembro de 2013, ela colocou o Brasil novamente na capa. Desta vez, o Cristo não decolava, mas despencava. A manchete questionava: "Has Brazil blown it?" (O Brasil estragou tudo?). Considerando a crise econômica que veio depois, parece ter sido um ato vidente. Que lucidez!
Em setembro, a revista Economist deu sinais de que pode ser profética em relação ao Brasil novamente, em um artigo com uma ilustração de Bolsonaro e o título: "Os incêndios na Amazônia poderiam queimar Jair Bolsonaro".
Com Bolsonaro, o Brasil voltou a se destacar nas manchetes mundiais. Somente nos últimos dois meses, de julho até setembro, foram publicados 1.195 textos sobre o Brasil em jornais e revistas alemães. Mas infelizmente não foi para transmitir euforia e alegria.
O país recebeu atenção devido a aspectos negativos que agridem e arranham a imagem do Brasil no mundo e causam aflição e depressão. E o quinto maior país do mundo merece mais do que manchetes. A velha jogada de marketing "fale bem ou fale mal, mas fale de mim" não se aplica a governos.
Fazer um bom marketing não quer dizer que se faça um bom governo também. Por exemplo, a sugestão de Bolsonaro de reflorestar a Alemanha não traz nenhuma árvore de volta à Amazônia. Tampouco o acesso facilitado a armas transforma cidades brasileiras em lugares mais seguros.
A dispensa de médicos cubanos também não contribuiu para melhorar a saúde pública brasileira. Pelo contrário. Os médicos cubanos fazem tanta falta que o governo brasileiro decidiu regulamentar a concessão de residência para cubanos que participaram do programa Mais Médicos. E tem ainda os cortes drásticos na área da educação, que não vão ajudar a geração futura do país a sobreviver num mundo globalizado.
Então, mesmo reconhecendo que Bolsonaro "presenteia" jornalistas no mundo inteiro com manchetes, não vou agradecer ao presidente. Mesmo sabendo que ele tem que cuidar da própria saúde. Mesmo sabendo que ele mandou o Exército para a Amazônia para apagar incêndios. Pois nem o Exército pode apagar as chamas políticas que ele acendeu.
Astrid Prange de Oliveira
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