Para apresentar seu livro nesta sexta-feira na Casa América de Madri, Finchelstein cruzou o Atlântico em sentido inverso ao das suas ideias oito décadas antes. Logo após a Segunda Guerra Mundial, com uma Europa abrindo os olhos para o alcance do horror nazista, e com a África e Ásia majoritariamente imersas no colonialismo ou sob regimes de partido único autoritário, a América Latina era o berço natural dessa "reformulação" do fascismo que é o populismo, argumenta. "Era o único lugar onde os fascismos não tinham perdido a legitimidade e havia um marco democrático. Não há nada de especial na América Latina naquele sentido", observa. Primeiro foi o peronismo, em 1946. Pouco depois, o regime de Getúlio Vargas (1951) no Brasil. Ambos percorreram um caminho similar: chegar ao poder a partir da ditadura e a destruíram por dentro para criar uma democracia. "O fascismo, nos casos mais paradigmáticos, que são a Alemanha e a Itália, chega ao poder através da democracia e cria uma ditadura. O populismo faz o contrário", observa, sobre seus inícios.
A situação se tornou mais complexa nas décadas seguintes, com populismos em diferentes continentes – tanto de esquerda como de direita – articulados em torno dos mesmos elementos: a identificação entre líder e povo, o culto semirreligioso ao dirigente, a substituição das categorias ideológicas clássicas pela dicotomia entre os de cima e os de baixo ("meus sujinhos", como os chamava Evita), o menosprezo pelos opositores e a imprensa crítica... Finchelstein cita os casos, com modelos neoliberais, de Carlos Menem na Argentina, Silvio Berlusconi na Itália e Fernando Collor de Mello no Brasil. Ou, da esquerda ou com estampa social, dos Kirchner, de novo na Argentina, e de Hugo Chávez na Venezuela. Entretanto, opina o especialista, "o que havia de populismo na Venezuela se perdeu, e estamos falando de formas que estão mais próximas de uma ditadura".
Em alguns casos, o populismo significou ao mesmo tempo "uma ampliação e uma limitação de direitos". Um "pacote", nas palavras do especialista, pelo que "os pobres são menos pobres e os ricos menos ricos", mas o líder "é o único dono da verdade, e aqueles que não estão de acordo passam a ser definidos não só como opositores políticos, mas também como o antipovo. Isto soa muito fascista porque tem origens fascistas", acrescenta.
Ao longo do livro o nome de Donald Trump aparece com frequência como exemplo de uma tendência que preocupa Finchelstein: a emergência de "um novo populismo que combina o neoliberalismo com ranço fascista". "Não é uma volta do parafuso nem um círculo completo, mas, embora a história do populismo, à esquerda ou à direita, sempre tenha a ideia de reformular a democracia em termos autoritários sem voltar à tradição fascista, estes novos populistas fazem uma tentativa explícita de voltar a elementos centrais da tradição fascista: racismo, violência política e, em casos como o de Bolsonaro e Trump, elogios teóricos da ditadura". O presidente brasileiro é, acrescenta, "um dos populistas mais próximos ao fascismo que já vi".
O racismo foi justamente uma das diferenças entre os populismos de esquerda e os de direita. Os primeiros "têm uma visão de povo que é autoritária, mas que permite ser aceito se a pessoa estiver de acordo. Nos de direita, o povo também é construído por coisas que a pessoa não decide, como a cor da pele".
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