Não há dúvida, portanto, que a criação do Estado foi uma conquista histórica da humanidade. Que deu razão ao grego Aristóteles, filósofo que a defendia.
Mas o Estado não é uma pessoa natural. Ele é uma pessoa jurídica, vale dizer, uma ficção concebida para que uma nação se libertasse do poder pessoal de seus governantes. Que se subordinariam, igualmente, à lei comum. E igualmente seriam julgados, como seus governados, pelos atos ou omissões que a infringissem.
Moisés, ao perceber que os hebreus que ele havia libertado da escravidão se rebelavam contra ele, subiu o monte Sinai e de lá trouxe duas tábuas com os dez mandamentos invocando Jeová como seu legislador. Pois é claro que se sentia descredenciado como líder daquela gente que se exasperava no deserto a caminho da Terra Prometida. (O maravilhoso é que aqueles dez preceitos não foram insculpidos para acudir àquela situação dramática de um líder angustiado, mas como paradigmas para o ser humano. O que confirma sua inspiração divina.)
Não é o caso do Estado. Este é um produto histórico, mas do intelecto. Da razão, da qual é sempre prudente nós duvidarmos. (Segundo o poeta Trilussa: "Os racionalistas ensinam que nós devemos duvidar de tudo. Então eu comecei por duvidar da razão".)
O que dizer do Estado, essa figura jurídica que nada tem de mistério, de divina? Mas que é um produto histórico do nosso intelecto?
Direi que sua autoridade, não sendo inefável, sempre estará submetida à crítica que dele fazemos quanto a suas leis, sua execução e o julgamento que delas faz afronta os princípios que Deus, que nos criou à sua imagem e semelhança, inscreveu em cada um de nós: a ética.
Precisamos colocar o Estado em seu devido lugar. Claro que ele não é religioso. Assim como não é gremista, não torce pelo Internacional, não gosta de chuva nem gosta de sol. Nunca foi à missa nem mandou oferenda a Iemanjá numa praia baiana ou carioca. O homem que o criou não foi capaz de soprar nenhum espírito em suas narinas. (Só os marxistas lhe atribuem uma vida própria. E o transformaram num Frankenstein.)
Quem existe, em carne, osso e alma é a nação. Que o Estado precisa refletir por aqueles que legislam, executam suas leis e julgam segundo seus preceitos que normatizam a vida em sociedade. E faça tudo isso segundo critérios isonômicos.
E o nome disso é democracia.
Mas o que vemos é que o Estado nunca refletiu a nação brasileira. Que vive uma crise cíclica, interminável, em intervalos tão curtos que nem esperam o fim de uma geração para se repetirem, cada vez mais intensamente.
Como é que o Estado sempre se preserva dessas intempéries da política?
Ele se preserva por seus agentes porque nós somos muitíssimo emotivos e muito pouco racionais. Como se diz que é próprio dos latinos.
Por exemplo: Eduardo Cunha renunciou ao mandado de presidente da Câmara dos Deputados. E o fez em grande estilo, com a leitura de um simulacro de carta-testamento em que denuncia seus perseguidores políticos, mantendo o privilégio de manter o foro privilegiado para entrar na História, segundo a promessa que lhe fizeram os atuais ocupantes do poder. O impeachment de Dilma seria um protagonismo dele. Não é bonito demais?
E justificou sua renúncia com o bem que ela faria ao Brasil, já que a Câmara dos Deputados estaria "acéfala". Bonito é pouco, isso é lindo demais!
Mas é, também, sintomático de que o governo interino está fazendo o que o governo suspenso tentou fazer, mas não foi capaz de providenciar. Por absoluta ingovernabilidade: preservar o poder. O que é muito diferente, e frequentemente contraditório com manter-se, indefinidamente, no poder. Como quis o PT.
O Estado se preserva. E é necessário que assim o faça. Mesmo que à custa de certo sacrifício de nossas expectativas. Ilegítimo, inaceitável é o Estado governado pr quem não se espelhe numa nação.
Como foi o Estado que até há pouco tempo o PT dele se apropriou para nos extinguir como nação.
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