sábado, 4 de junho de 2016

O pretenso direito de mentir ao povo que derrubou presidentes

A senhora presidente faria muito melhor se mantivesse indispensável recato e discrição. É que o afastamento a obriga a guardar distância dos acontecimentos, até que terminem os procedimentos jurídicos previstos e seja lavrada a decisão sobre os atos praticados no exercício da Presidência infratores da responsabilidade fiscal.

Os fatos que vieram à luz, nos quais se fundou a Câmara dos Deputados para proclamar a existência de crimes suscetíveis de declaração do impeachment (“indictment”), guardam um conjunto de evidências difíceis de elidir. Entretanto, ruidoso tem sido o comportamento da presidente afastada, que tem falado pelos cotovelos, sem perder oportunidade para despejar ódio pela situação que autoritariamente criou; o respeito pela curul presidencial que o povo lhe delegou tem sido quebrado, como se estivesse agraciada com um “bill of indeminity” e uma espécie de monarquia que ignora limitações, cuja essência democrática desconhece, voltando-se apenas para sua aparência formal.


Daí, talvez, o sentido das normas reguladoras da monarquia parlamentar no Reino Unido não lhe esteja presente, assim como a evolução do próprio regime monárquico e parlamentar britânico e sua lenta e decidida evolução no tempo, a ponto de instituir bravamente, em seu território, uma dos mais sólidas democracias do mundo.

Quiçá a presidente Dilma tenha se inspirado nele, sendo, ela mesma, a soberana no Estado brasileiro. Contudo, ignorante da jornada política britânica, concluiu S. Exª. que igual benemerência lhe veio pelo voto popular, do qual extraiu não as lições dos ingleses e seus avanços históricos, mas, talvez, a crença no direito divino de governar sem limitações morais e jurídicas, mercê do poder de sua vontade.

Foi, dir-se-ia, apenas ligeira a confusão com o reinado de Elizabeth I, no longínquo século XVI. Eis o pretenso direito de mentir ao povo. Aliás, para deitar falação, nossa “rainha” acabou se tornando mestra à altura de seu protetor e preceptor, talvez um pouco abaixo, nada além de um bemol.

Nossa frustrada mandatária me lembra algo do ex-presidente Nixon, um mentiroso pego, afinal, pela pertinácia de dois jornalistas, em sua participação no episódio Watergate. A mentira e o gosto pelas palavras abundantes e malformadas foram o instrumento principal de sua defesa e sua queda. O povo norte-americano, por participar dos benefícios da democracia, não tolera a mentira, seja lá qual for o motivo de seu uso. Se algumas vezes o mentir foi do ex-presidente fator de glória, em compensação foi também o de sua queda. Falou demais e mentiu o tempo todo, ignorando a advertência de Lincoln. Quando tudo perpassou o véu da mentira, sobreveio-lhe a caída inevitável; e, quando o sucessor Gerald Ford lhe concedeu o perdão presidencial, já não adiantava nada: tudo se consumara, e as trevas o cobriram definitivamente.

Demais, um artigo de autoria de Gustavo Franco, em “O Globo” de domingo último, trouxe-me à boca amargo gosto: “E também para que se tenha claro que foi Dilma Rousseff quem transformou um resultado positivo médio da ordem de R$ 190 bilhões – 3% do PIB – em um negativo de R$ 170 bilhões” . Tudo somado, conclui, “a deterioração fiscal, em valores também fiscais, sobe para R$ 360 bilhões, se quisermos o país de volta na situação em que estava no período de 1998 a 2007”.

Qual a sentença a ser lavrada? Apenas esta: “Considerado o comportamento da senhora presidente da República, esta Corte de julgamento declara o impeachment da ré”.

Simples e definitivo.

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