quinta-feira, 28 de maio de 2015

Se os olhos reaprendessem a chorar, seria um segundo dilúvio

Está tudo muito estranho. Até o céu azul deste mês de maio, que outrora se iniciava no princípio de abril, só agora, a partir do último fim de semana, voltou a mostrar sua estonteante e incomparável beleza. Com esse céu, leitor, tão limpidamente azul, que inspirou tantos poetas, qualquer esperança sobrevive, por mais infundada que seja. Só pode ter sido ele, então, que deu força à presidente Dilma para concluir que o pior em seu governo já passou. Para ela, esse imenso barco, no qual lutamos para sobreviver, retomará seu rumo, mas agora em águas mansas e, quem sabe, sem os inconvenientes da operação Lava Jato…

É assim: quem está no poder não sente os baques…
Confesso que, de fato, impressiona-me a disposição da presidente e/ou a tranquilidade (ou o alheamento?) ao afirmar ao jornal mexicano “La Jornada” que o impeachment não a assusta: “O problema do impeachment”, disse ela, “é sem base real. Vire e mexe tem essa. A mim não atemorizam com isso. Eu tenho clareza dos meus atos”.

Está mesmo tudo muito estranho: a presidente prega a necessidade do pacote, mas não se acha obrigada a colaborar com ele. Você já ouviu a presidente ou alguém por ela afirmar que o governo não vai cortar somente na nossa, mas também na própria carne? Pelo contrário, com um Estado gigantesco, com quase 40 ministros, o gasto público, em todos os Poderes, vai de céu de brigadeiro. Ou seja: quem vai pagar o pato é o povo, por meio de cortes, sobretudo, na saúde e na educação. Pois não é ele o responsável final pelo que acontece no país?

O deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara Federal, ainda não contente, após meses de trabalhos, pesquisas e debates, pôs fim à Comissão de Reforma Política, mas sem nenhum relatório conclusivo. Segundo Cunha, a extinção da comissão e a destituição do seu relator surgiram de decisão dos líderes. Agora, é seu presidente, deputado Rodrigo Maia, quem relatará a reforma no plenário.

Depois de parecer encomendado ao jurista Miguel Reale Júnior, que levou a direção do PSDB a desistir de bancar, neste momento, o pedido de impeachment da presidente, grupos contrários a ela reagiram contra, também, a oposição, na pessoa do senador Aécio Neves. Acusam-no de alta traição. O Movimento Brasil Livre (MBL) marcou encontro para ontem, e no cartaz que distribuíram há dias lia-se esta frase: “Aécio traiu o Brasil”. “O PSDB”, afirmou o MBL, “disse que não irá aderir à pauta do impeachment, traindo os mais de 50 milhões de votos na última eleição de brasileiros que apostaram nessa falsa oposição que continua nos decepcionando”. Está ou não tudo estranho?

Para esses grupos, não vale a iniciativa da oposição de ingressar, por sugestão do jurista, na Procuradoria Geral da República, com pedido de abertura de investigação contra a presidente, fundada nas pedaladas de autoria do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.

Querem mais, querem ver é o sangue rolar quente!

Hoje não tenho escolha, leitor, a não ser me juntar ao jornalista Luiz Fernando Vianna, da “Folha de S.Paulo”, na homenagem que prestou ao nosso poeta Carlos Drummond de Andrade: “Os homens não melhoraram/ e matam-se como percevejos./ Os percevejos heroicos renascem./ Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado./ E se os olhos reaprendessem a chorar, seria um segundo dilúvio”. E mais: “Deus vela o sono e o sonho dos brasileiros./ Mas eles acordam e brigam de novo”.

Até a próxima semana, se Deus quiser!

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