quarta-feira, 6 de novembro de 2024

A última a morrer

Um estudo recentemente concluído nos Estados Unidos, com base em entrevistas a capelães de hospitais de regiões diferentes do país e de diversas origens religiosas, mostrou que a área religiosa e espiritual é fundamental para a recuperação e o bem-estar dos doentes, suas famílias e igualmente importante para o trabalho das capelanias que operam na saúde. Acresce que foram consultados capelães de origem cristã, judaica, islâmica e humanistas seculares.

Uma sondagem realizada em 2023 pela Universidade de Chicago já tinha revelado que mais de setenta por cento dos norte-americanos acreditavam no poder da oração, e associavam a frequência de serviços religiosos a um menor risco de morte, suicídio e abuso de substâncias, assim como a menor ocorrência de episódios depressivos.

As conclusões da investigação apontam para o facto de que os indivíduos com fé religiosa encontram dentro de si forças psicológicas significativas para enfrentar a doença e mesmo para a combater. E quando acabam por ser vencidos pela sua patologia, se acaso dispõem de acompanhamento espiritual, os seus últimos dias são frequentemente vividos com muito mais coragem e ânimo.


De facto, a oração (falar com Deus) tem um efeito diversificado conforme os casos, mas sempre eficaz, quando o próprio doente recorre a ela ou é alvo da oração de intercessão em seu favor por terceiros. A religião e a espiritualidade ajudam a superar sentimentos como o medo e o desespero em pacientes com doenças graves.

Aliás, os estudos em neurociências efectuados nas últimas décadas têm vindo a revelar que as crenças religiosas influenciam diretamente zonas vitais do cérebro, ao desencadearem um efeito que pode proteger os indivíduos contra quadros depressivos e sentimentos negativos como o desespero. Além disso sabe-se que duma forma geral a prática religiosa e a espiritualidade podem proporcionar a construção de significado e um sentido para a vida, e por isso abrir a porta à esperança.

Estas vantagens podem não se verificar apenas em contextos de fé religiosa tradicional, mas igualmente pela via das artes, do belo, do exercício físico, do contacto com a natureza ou por práticas culturais que vão ao encontro dos seus gostos e interesses.

O ser humano precisa de esperança ao longo da vida, muito em especial quando enfrenta uma doença grave ou se sente perante a proximidade inevitável do final do seu ciclo de vida. Caso contrário surgem inúmeros problemas emocionais, mentais e até físicos que redundam na perda da qualidade de vida, causada por exemplo pelas alterações do sistema imunitário.

A alternativa é desistir, entrar numa espiral de ressentimentos, auto-piedade, remorsos ou revolta, o que não leva a lado nenhum e apenas piora a experiência desses tempos de luta contra a doença, de convalescença ou de espera pelo desenlace final.

O ser humano parece ser o único ser vivo que tem consciência de que a sua existência física tem um fim. Os outros seres vivos respondem a um instinto de sobrevivência, têm noção dos perigos que correm ou de quando estão feridos, doentes ou se sentem enfraquecidos, mas não propriamente a consciência de que um dia desaparecerão deste mundo.

Só que esta certeza que todo o ser humano adulto possui carrega consigo implicações emocionais muito profundas. Desde logo a valorização dos seus dias, dos entes queridos e a preparação para o fim. As questões existenciais assumem assim uma relevância crescente à medida que a idade avança, ou que o corpo e a mente vão dando sinais crescentes de debilitação e perda de faculdades a cada dia que passa.

É por isso que a esperança deve ser sempre a última a morrer.

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