quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Guarujá é o novo Jacarezinho

Ainda não se sabe quantas pessoas morreram no final de semana passado no Guarujá, durante a Operação Escudo. Depois do assassinato de Patrick Bastos Reis, soldado da Rota, na quinta-feira, centenas de policiais passaram os dias seguintes na cidade em busca dos responsáveis.

Mas, já na segunda-feira, havia uma pessoa bem satisfeita com os resultados da intervenção policial: "Eu estou extremamente satisfeito com a ação da polícia", disse o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, numa coletiva de imprensa em 31 de julho.

Naquela entrevista, Tarcísio falou de oito óbitos durante a operação, que o governador chamou de "profissional". Nas suas palavras, "nós temos uma polícia treinada e que segue à risca a regra de engajamento".


A defesa das ações policiais pelo governador soava absurdamente prematura, tendo em vista que a Ouvidoria da própria polícia tenha ouvido vários relatos de abusos dos policiais, de torturas e de execuções. O Ministério Público já está investigando os casos.

Como o governador podia, portanto, ter tanta segurança de afirmar o profissionalismo da sua tropa? Como podia ter certeza de que não havia "excessos", sem conhecer os resultados das investigações?

Na terça-feira, Tarcísio já falava em 14 mortes, enquanto o número de até 19 mortos circulava na imprensa. Parecia que Tarcísio teve que recuar frente às alegações, pelo menos um pouco. "Se houver excessos, vamos punir os responsáveis", prometeu o governador. Mas logo acrescentou que até agora não tinha chegado a ele nenhuma informação de que houve excessos. Mas, sim, efeitos colaterais: "Não existe combate ao crime sem efeito colateral".

Tarcisio já soa como Cláudio Castro, o governador do Rio de Janeiro, que chamou as 27 pessoas mortas pela polícia em maio de 2021, no Jacarezinho, de "vagabundos". Como no Guarujá, a polícia entrou na comunidade, naquele dia em 2021, depois de um policial ter sido morto por bandidos. E, aparentemente, com sede de vingança.

É da natureza humana um sentimento de vingança pela morte de um companheiro. Mas o estado e seus representantes não podem se deixar levar por tais sentimentos. Eles precisam agir de forma cautelosa e respeitar o direito de cada cidadão de ser considerado inocente até provar o contrário.

Sabemos que os policiais enfrentam, muitas vezes, bandidos altamente armados, e que os policiais têm todo o direito de se defender. Mas não são justiceiros, e sim profissionais, agentes do estado. Precisam ser um exemplo de civilidade em meio ao caos que reina infelizmente em muitos cantos deste país.

É ainda mais problemático que tanto Tarcísio como Castro aparentemente festejam as mortes dos "suspeitos". Igual ao ex-governador Wilson Witzel, que em 2019 celebrava a morte de um sequestrador com pulos no ar. Parecem torcedores da morte, esses homens que se apresentam como "quadros técnicos" e tanto falam em Deus.

O caminho do combate ao crime organizado não pode ser de se igualar ou até superar a brutalidade dos próprios bandidos. Mas de agir com uso de procedimentos de inteligência. No caso de São Paulo, com o uso das câmeras portáteis nos uniformes dos policiais, houve uma redução das mortes causadas pela polícia entre 2019 e 2022, de 697 mortes para 260.

Até que Tarcísio de Freitas veio do Rio para São Paulo com um discurso de tirar as câmeras novamente. Desde que ele assumiu o governo paulista, em janeiro, o número de pessoas mortas pela polícia aumentou, de 123 pessoas no primeiro semestre de 2022 para 155 no primeiro semestre deste ano.

Vamos torcer para que o carioca Tarcísio, que costumava andar na garupa de Bolsonaro, não traga maiores índices de letalidade policial para São Paulo. No Rio, a polícia matou, no ano passado, 1.327 pessoas. Em comparação, a letalidade policial no Rio tem sido 20 vezes maior que em São Paulo.

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