sábado, 10 de setembro de 2022

O que ainda resta a um presidente fraco?

Duzentos anos da Independência do Brasil: momento singular e excepcional para qualquer estadista à frente da festa pretensamente cívica.

Mas, longe disso, o que se viu foi o presidente converter a celebração em atos eleitorais, aos sons e gritos do que lhe restou de apoiadores. Obviamente, o presidente-candidato cruzou várias linhas nas comemorações do 7 de Setembro. Recorreu, abusivamente, a recursos públicos para fazer campanha e demonstrar força política na sua cruzada pela reeleição.

Não surpreende. O presidente nunca compreendeu o sentido da posição que ocupa e o decoro que ela exige. Vê o seu lugar na política sob uma lógica expropriatória, como foi ao longo da sua carreira parlamentar e desde o seu primeiro dia na Presidência. "Passar a boiada", "não sou coveiro", "comprem suas armas! Isso também está na Bíblia...", "não vou cumprir (decisão do STF)" foram manifestações emblemáticas dessa lógica desapropriadora da coalizão no governo 


Logo, o 7 de Setembro e os abusos do chefe do Executivo não são obra de um candidato débil, mas de um presidente fraco. Mas esse não é um lugar que o presidencialismo, em geral, reserva aos seus líderes. Com todos os poderes institucionais que conta, o presidente no Brasil é capaz de forjar escolhas que o tornem ator pivotal no governo e na sucessão presidencial.

Não foi o que vimos ao longo dos últimos três anos e meio. Bolsonaro fechou porta atrás de porta desde 2019. Desperdiçou a lua-de-mel com o Congresso, só viu na pandemia a oportunidade de radicalizar sua retórica contra instituições e atores políticos e, presidente minoritário, preferiu uma espiral de mudanças ministeriais que, longe de ampliar a sua coalizão política, o fez retornar às suas origens, a "velha política".

O Bolsonaro que chegou ao palanque em 7 de setembro deste ano é o presidente que se construiu fraco ao longo do mandato. Não é, certamente, um pato manco, expressão reservada aos presidentes que se mostram irrelevantes nas disputas, a despeito da posição institucional e dos poderes do cargo. A resiliente segunda posição de Bolsonaro ao longo dessa campanha, com 31% das intenções a um mês do pleito, segundo pesquisa do Ipec, sinaliza competitividade eleitoral. Mas a rejeição do candidato Bolsonaro entre quase metade dos eleitores (49%), mesmo após a ostensiva política distributiva para fins eleitorais,viabilizada pela Emenda Constitucional 123, dá a estatura da fragilidade do presidente.

Uma fragilidade que nos ajuda a entender não só o que foram os palanques do 7 de Setembro, mas também a dinâmica da disputa presidencial em curso. A estabilidade das intenções de voto já é a marca desta eleição. É inegável que esse resultado tem o mérito de Bolsonaro.

A estabilidade do quadro eleitoral cristaliza uma coalizão de veto ao presidente e ao seu governo que, democraticamente, espera as urnas para mostrar a sua força. Esse tipo de coalizão tem se tornado mais frequente em contextos de crises em camada, como a que marca o Brasil nos últimos anos. Talvez seja este o desafio desses tempos: entender como essas coalizões que se formam não em favor de algo, mas contra o que se entende por indesejável, realizam o potencial da democracia.

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