quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

A milícia no poder

Para visitar o pai em Porto da Rosa, São Gonçalo, periferia de Niterói, Maria do Socorro é obrigada a se identificar em mais de uma barricada formada por traficantes e milicianos. Grades fincadas no concreto em plena área pública. Bandidos exibindo armas. Ruas assombradas. Por onde transitam crianças, velhos, trabalhadores. 

São 22 mil habitantes em Porto da Rosa.

Vila do João, na Maré, uma das maiores favelas do Rio de Janeiro, Suzana, motorista de aplicativo tem o carro seguido por traficante armado, até a casa do cliente. Faróis ligados, vidros abaixados. Rotina de terror. O motoqueiro armado segue o carro na volta até que saia da área dominada. 

Conjunto habitacional criado pelo Projeto Rio, do Governo Federal, década de 80, para abrigar pessoas que viviam em palafitas na Baixa do Sapateiro, Vila do João, por ironia, foi batizada em homenagem ao General João Baptista de Oliveira Figueiredo. Hoje, cerca de 12.000 pessoas vivem sob o vergalho da milicia e do tráfico. 

Em Vai quem quer, em Caxias, subúrbio do Rio, a vizinhança anda aterrorizada pelas armas escancaradas no meio da rua. Pior, por noticias arrepiantes de massacre de jovens que não colaboram com os bandidos. Rotina de pânico. 



Quem estuda o assunto, no Ministério Público, diz que há menos de 20 anos se formava em Rio das Pedras o primeiro grupo que começaria a explorar a população pobre da periferia. Em 2019, calcula-se que a milicia já domina 26 bairros da capital, e dezenas de cidades do interior do estado. 

O crescimento das milicias é tão expressivo que a guerra com entre milicianos e traficantes, antes quase diários, vem rareando. A Polícia Civil, segundo reportagem de Henrique Coelho, do G1, afirma "que a união de grupos paramilitares desbancou o tráfico e passou a comandar as comunidades praticamente sem resistência". Na Grande Jacarepaguá, apenas a Cidade de Deus está sob o comando do tráfico.

Bandidos da mesma laia, qual seria então a diferença entre traficante e miliciano? 

"O traficante nunca terá carreira em ascensão. No máximo, preso, controla a facção da prisão. O traficante está restrito na escala de poder à área onde ele está. Eles não conseguem eleger pessoas como a milícia", analisa José Cláudio Souza Alves, sociólogo, professor da UFRRJ, estudioso da atuação das milícias na Baixada, região com os piores números de violência do Estado. 

A milícia, ensina o professor, tem um poder maior, muito superior, não tem comparação. "Nós saímos da ditadura oficial para a ditadura dos grupos de extermínio e milícias". 

Um traficante nunca será candidato a nada. O miliciano se elege.

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