Brumadinho, filmado pelos próprios assassinos, é do horror mais absoluto.
Nem Hitchcock, nem Brian de Palma, nem Jack Nicholson com o machado vagando pelos corredores do hotel de "O Iluminado", nada passa mais desespero a qualquer espectador da história do cinema do que a cena dos carros de Brumadinho quando percebem a torrente de lama que se aproxima. Seus motoristas viram para um lado, rodopiam para o outro, e meia dúzia de segundos antes do ato final percebem que não sobreviverão. A lama que inicialmente vinha apenas pela frente já fez a volta, cercou os carros por todos os lados e não resta a eles se não a entrega à mais terrível das mortes. | |
Desta vez, não é o cinema catástrofe feito com miniaturas em Hollywood, com tudo reproduzido a uma exatidão impressionante e com as câmeras certas para dar a ilusão ao espectador no cinema de que a vida humana não vale nada e a qualquer momento a grande tragédia se abaterá sobre os homens. Desta vez, o pavor é de verdade. É tudo real o que está divulgado pela Vale. No canto à direita do filme, o trem com mais de uma dezena de vagões, sabe-se lá quantas pessoas dentro, é composto do mais concreto ferro, das mais exasperadas toneladas de aço, e ele vai sendo arrastado pela correnteza de dejetos, como se fosse um trem de plástico da Estrela. A bruxa de Blair, "Carrie, a estranha", ou "Chuck, o boneco assassino", são criações de artistas geniais para quem gosta de pagar ingresso e se sentir a poucos passos do grande susto do momento fatal. O diretor do filme de Brumadinho não é Stanley Kubrick, o genial manipulador de sentimentos. É a Vale. Como se fosse um Hitchcock, que desenhava todas as cenas antes de realizá-las, a mineradora sabia que tudo aquilo poderia acontecer e que, no entanto, Brumadinho não era um set de filmagem. Mesmo assim não tomou providências. Deixou que o filme rolasse. No caso do diretor de cinema de Hollywood, a palavra mágica é "ação". Em Brumadinho, o que acionou a cena trágica foi a falta de ação. É possível ver movimentação de vítimas tentando escapar do mar de rejeitos. E eis que a câmera em cima do guindaste começa a filmar o horror da lama escorrendo, uma tomada mais apavorante do que todas as de "O inferno na torre", "Armageddon" ou de outro clássico do cinema catástrofe. Semana passada, o Brasil lamentou não ter qualquer filme concorrendo ao Oscar. Infelizmente, já temos. O terror é nosso. Joaquim Ferreira dos Santos |
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