Depois de ler a entrevista de Fernando Henrique Cardoso à última revista “Época”, em defesa do novo na política, e após refletir sobre as respostas do ex-presidente às perguntas formuladas pelos repórteres Daniela Pinheiro e Plínio Fraga, passei à leitura do excelente depoimento a Sílvio Essinger, na mesma revista, da cantora Cynara Faria.
Cynara foi responsável, ao lado de Cybele, Sonya e Cyva, pela criação do saudoso Quarteto em Cy. Ele gravou, desde 1964, mais de 30 discos e conquistou, com a canção “Sabiá”, uma composição de Tom Jobim e Chico Buarque, na noite de 26 de setembro de 1968 (tempos brabos!), o 3º Festival Internacional da Canção (FIC). O público que lotou o Maracanãzinho se revoltou com o resultado e lhe despejou tremenda vaia pelo fato de haver batido, na final, a bela canção de Geraldo Vandré “Pra Não Dizer que Não Falei das Flores”.
No depoimento prestado a Essinger, Cynara, que ficou revoltada com as vaias não apenas em razão da qualidade da canção vitoriosa, mas, sobretudo, porque Jobim e Chico não mereciam aquele tratamento, concluiu dizendo que aprendeu muito naquela noite: “O que aprendi ali, com a vaia do Maracanãzinho, pode ser resumido numa frase do Millôr Fernandes: o importante é nada. Tudo passa mesmo, e essa raiva que está aí, rondando todo mundo, vai passar”.
Nesta antevéspera de eleições, que se espera que sejam efetivamente livres, o Brasil vive o agravamento de uma crise política que fez retornar à cena essa raiva à qual se referiu Cynara Faria. Tanto os partidos quanto os políticos, de modo geral, perderam credibilidade e, hoje, são objeto de puro ódio. Mesmo assim, pelo menos para mim, e exatamente por isso, por mais paradoxal que lhe possa parecer, leitor, o momento por que passa o país, em razão das eleições que vêm por aí, deveria ser considerado por todos nós rico de oportunidades.
O jornalista, dramaturgo e escritor Millôr Fernandes foi muito bem lembrado por Cynara Faria. Na verdade, Millôr disse muito mais em seus famosos textos e frases. Uma delas poderá nos servir de estímulo e, ao mesmo tempo, de alerta: “Tudo passa. Chuva passa, tempestade passa, até furacão passa. Difícil é saber o que sobra”.
As eleições, essa real oportunidade que, mais uma vez, se abre a nossa frente, com certeza acontecerão e, obviamente, passarão. A ocorrência delas, por si só, não basta ao país. O importante depende do que vai sobrar delas. Teremos, a partir de 2019, um país dividido? Ou, ao contrário, lutaremos para debelar o ódio que parece ter tomado conta da sociedade brasileira? Ou, enfim, por meio do diálogo, proporcionaremos às gerações novas um futuro realmente esperançoso?
Esse futuro esperançoso a que me refiro depende de nosso voto. Temos que escolher, com responsabilidade e conhecimento de causa, os que nos representarão na Presidência da República, nos governos estaduais, no Senado, na Câmara e nas Assembleias legislativas. Só nosso voto terá o condão, leitor, de torná-lo realidade.
O paradigma, a conduta e o comportamento adotados há muitos anos por grande parte de nossos políticos e, em menor escala, pela sociedade brasileira terão que mudar. Essa mudança, com certeza, nos livrará desse pântano no qual o país afunda a cada dia que passa. Lembremo-nos, por fim, mais uma vez, de Millôr Fernandes: “Ser feliz é tão simples, mas tão simples, que todo mundo esqueceu como é”.
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