Se não fosse aquela irresponsável confusão que armaram ao governar (junto à base alugada) como se estivessem jogando futebol nos jardins do Palácio da Alvorada, talvez jamais se descobrisse a amplitude do corrupto contubérnio entre políticos e empresários. Tão amplo e profundo que deixa nus os partidos, enlameia a alta cúpula do PMDB e o círculo íntimo de Michel Temer, roçando e bafejando o próprio presidente da República.
A facilidade do futebol de fim de semana saltou para o dia a dia da política e o “mensalão” comprou deputados e senadores da oposição, no varejo e no atacado. Surgiu a base alugada (batizada de “base aliada”) e o PMDB e o PP ancoraram no quintal da própria casa o luxuoso navio que o PT lhes entregou para navegar no rico e imenso mar da Petrobrás.
O mesmo descuido, porém, que fez o indestrutível Titanic bater num iceberg e naufragar, fez surgir a Lava Jato e aconteceu o que todos sabem!
A corrupção não surgiu do futebolzinho do Lula, como marota “pelada” com resultado já combinado. É anterior, vem do século 20. Foi acintosa na construção de Brasília e continuou. Na ditadura, cresceu protegida pela impunidade, mesmo sem conspurcar pessoalmente os generais ditadores. Existiu nos governos Sarney, Collor (em especial aí) e Fernando Henrique. Com Itamar não há indícios, ou não deixou rastro.
O jogo de bola, porém, serviu como modelo para expandir e consolidar a organização criminosa que, até então, era algo avulso. Com ele se construiu a máquina corrupta no engajamento (ou recrutamento) de certas pessoas em cada lado – entre os corruptos e os corruptores, entre políticos e empresários – para armar duas equipes e poder jogar. Tudo como num bate-bola no quintal, em que todos são amigos, estão irmanados e só buscam usufruir e lucrar. Constituem equipes diferentes na aparência, mas são iguais entre si.
Há, porém, uma diferença fundamental: no jogo de bola eram companheiros, no crime são cúmplices.
O desbaratamento do conluio da era Lula e Dilma, porém, não serviu para que Temer mudasse o rumo. Ao contrário, o peso dos pesos pesados cai, agora, sobre seu governo, quase sempre sobre figuras do PMDB, que ele dirigiu nacionalmente até há bem pouco, até presidir a República, e no qual é, ainda, figura exponencial.
Não é preciso detalhar os últimos escândalos. Ou recordar os dois “operadores” do PMDB (presos nos Estados Unidos) que arrecadavam e redistribuíam o dinheiro sujo. Nem o relato espontâneo do advogado José Yunes, velho amigo e então assessor do presidente, sobre “o envelope” (ou seriam caixas de whisky?) com dinheiro que o ministro Eliseu Padilha pediu que recebesse em São Paulo e, logo, lhe entregasse.
Se o homem forte do governo Temer (um José Dirceu da era Lula) age assim, o que esperar dos demais nesse Ministério sem grandes figuras, formado para obter maioria parlamentar?
Na sordidez em que transformaram a política partidária, porém, isso se tornou tão comum que já não surpreende nem causa indignação. Mas exatamente aí reside o perigo de que esse horror transformado em algo “normal”, ou usual, leve ao suicídio ou ao assassinato da política partidária.
Até agora, há 83 condenados ou presos em função da Lava Jato e 86 políticos de diferentes partidos (menos o PSOL e a Rede) são réus, estão denunciados ou sob investigação. No Rio, o ex-governador Sérgio Cabral e assessores (ou asseclas) estão presos, tal qual Eike Batista, ex-candidato a “homem mais rico do planeta” com dinheiro do BNDES. Na senda certa, Ministério Público e juízes desbravam caminhos por mares nunca antes navegados!
Como punição para o crime, tudo perfeito. Nestes três anos da Lava Jato, porém, nem as punições corrigiram os métodos de governar.
A indicação do ministro da Justiça Alexandre de Moraes para o STF reabriu o debate sobre as condições de notório saber e integridade pessoal exigidos de um juiz da máxima Corte. Apontado como advogado ligado ao PCC e de plágio de trabalho de um jurista espanhol já falecido, ele saltou do Executivo para o STF como se Temer buscasse ter ali um “nome de confiança”, já que não tem uma corte áulica e servil. No tempo de FHC, também um ministro da Justiça pulou para o STF. Mas Nelson Jobim ainda não confessara que, quando deputado, tinha incorporado sub-repticiamente à nova Constituição artigos nunca votados, e foi aplaudido. Não há crime no que não se conhece…
O novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio, foi defensor ardoroso de Eduardo Cunha e, quando ele finalmente foi preso, fez uma apocalíptica declaração de pesar. “É a queda da República!”, exclamou. Logo, votou a favor da punição de juízes e procuradores por “abuso de autoridade”. Colocado de contrabando pelos deputados no projeto de iniciativa popular contra a impunidade, o dispositivo abre caminho ao crime e inibe a ação da própria Polícia Federal, da qual o ministro é o comandante…
Mesmo sem nada corrigir, o “mensalão”, primeiro, e agora a Lava Jato são a grande herança que Lula legou ao futuro. Faça-se justiça, portanto: sem as trapalhadas de Lula, do PT e da base alugada, nada saberíamos e o Titanic estaria navegando pelo fundo do mar, de casco arrombado, afogando todos nós.
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