segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Justiça e ovos de galinha

Canadá e natureza são inseparáveis. Impossível esquecer. Em Vancouver, a natureza abraça a cidade. O planejamento urbano trata a natureza como parte do cenário. Sem que sua beleza seja subjugada, subestimada, ignorada.

Acesso fácil à natureza. É uma das razoes (ou talvez mesmo a principal) pela qual Vancouver está entre as cidades com maior qualidade de vida no planeta. A área rural esta próxima. 10 minutos de carro, no máximo. Ali estão fazendas, sítios, estufas. Pequenos e grandes agricultores. Agronegócio e agricultura familiar. Lado a lado.

Na beira das estradas, dá para comprar todo tipo de produto agrícola cultivado em pequenas propriedades. Não usam agrotóxicos. São orgânicos. Saborosos. Em particular, os ovos de galinha. Gemas avermelhadas, deliciosos e a bom preço. Mesmo se comparados com os preços de supermercado.

Compra-los é simples. Os pequenos agricultores mantem pequenas barracas na porta de suas casas. Os ovos ficam em embalagens de 12 unidades, dentro de uma caixa. Basta retira-los. O pagamento é depositado em uma pequena caixa ao lado. Se o troco for necessário, o comprador mesmo calcula e retira da caixa a diferença.

É um bom sistema. Funciona bem. E em todo lugar. Mas, para alguém vindo da América Latina, um detalhe sempre choca. Não existe supervisão. O dono da barraca está ausente e o comprador pode, em tese, não somente deixar de pagar, mas também subtrair do caixa o ganho do fazendeiro. Em geral, Latino-americanos, quando compram pelos ovos pela primeira vez, invariavelmente dizem que, em sue pais de origem, este sistema não seria possível.

Não existe, na verdade, razão concreta para este sistema não funcionar. E quando funciona, é melhor para todos. O fazendeiro não precisa incorrer em despesas adicionais para garantir a segurança do seu negocio. Portanto, os ovos são mais baratos. E o comprador se beneficia. Todos ganham.

Sistemas justos tendem a trazer benefícios coletivos. Em outras palavras, desonestidade, especialmente quando transformada em norma social, tem custo. Se a norma social é a desonestidade, desvia-se energia e recursos para controle e prevenção de condutas indesejáveis. É desperdício. Este tempo, energia e recursos seriam socialmente mais uteis se utilizados em outras áreas, produzindo, criando, ou mesmo patrocinando o ócio.

Seria perda de tempo discutir quem vem primeiro, o ovo (ovos, novamente!) ou a galinha. Não é relevante especular se a degradação ética é consequência de injustiças sistêmicas; ou se a injustiça sistêmica gera degradação ética. Basta compreender que a degradação ética gera custos. Cobra preços. Altos, alias.

No final das contas, honestidade e ética não devem ser encarados como virtude individual. É obrigação coletiva. Cultivar justiça sai barato. E é bom para todos.

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